segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Fisioterapia no Tratamento da Espondilite Anquilosante



A intervenção realizada deve ser adaptada à fase da doença em que o paciente se encontra. Deste modo, numa fase inicial, quando a rigidez não é pronunciada e não há adoção de posturas desadequadas, deve-se realizar menos vezes por semana e com menor intensidade, aumentando à medida que a doença avança.
A fisioterapia tem como objectivos o alívio da dor, manter/aumentar a mobilidade articular, performance física, flexibilidade e a força muscular para prevenir alterações posturais e as complicações, não comprometendo a capacidade funcional. Em casos mais avançados, a anquilose da coluna pode comprometer a realizaçao de determinadas actividades diarias, reduzir a expansibilidade torácica e, desta forma, comprometer a capacidade respiratória. Por este motivo, por vezes ainda há a necessidade de acrescentar um objetivo a nível respiratório.
A reeducação postural é considerada uma das prioridades que o terapeuta deve ter durante a sua intervenção, devendo esta ser geral e não localizada num determinado ponto, sendo a técnica de eleição a reeducação postural global. Recorre-se a posturas em carga e em decúbito, utilizando-se exercícios de alongamento e de reforço muscular, acompanhados com exercícios respiratórios para melhorar a expansibilidade torácica. Este trabalho surte grandes efeitos nos músculos posturais, o que permitirá um aumento da atividade proximal, o que possibilita a mobilidade distal.

Existem várias técnicas às quais o fisioterapeuta pode recorrer para diminuir a dor nestes pacientes, entre elas, o uso de calor, frio, terapia de ondas-curtas,  massagem e ultra-som. Para diminuir a dor sentida na região cervical, o paciente pode recorrer ao uso de um colar, usando este durante a noite. A tração apresenta elevada evidência na diminuição da dor cervical.
Os programas de exercícios supervisionados, de maneira sistemática em todos os estágios da doença tem os seus benefícios na prevenção de limitações funcionais através do aumento da força, da resistência e da flexibilidade, melhoria da mobilidade, melhoria da propriocepção e aumento da coordenação.
Estes exercícios devem ser do tipo aeróbio, podendo ser realizados em grupo ou individualmente. Existe evidência de uma maior eficácia quando o paciente é acompanhado por um fisioterapeuta, do que quando efetua os exercícios sem recorrer à ajuda deste profissional de saúde. No entanto, a revisão da literatura mostra que a combinação da fisioterapia com um programa de exercícios domiciliários, apresenta melhores resultados do que qualquer uma destas intervençoes de forma isolada.
Cada programa de exercício deve incluir:
·         Período de aquecimento (aprox. 10 minutos): exercícios aeróbios e de alongamento;
·         Corpo do programa de exercícios (aprox. 20 a 30 minutos): onde se deve realizar exercícios aeróbios, de fortalecimento, alongamento e endurance, podendo sempre de sessão para sessão variar a modalidade de treino aplicada;
·         Período de arrefecimento de 15minutos: exercícios de relaxamento muscular.
Durante todo o programa de treino, deve-se ter em especial atenção a parte respiratória, na qual pode-se realizar exercícios respiratórios durante a realização do mesmo, tendo como objectivos promover a respiração diafragmática e a expansão da caixa torácica.
A intensidade do exercício aeróbio é prescrita através da fórmula de Karvonen, e cada paciente, enquanto realiza o exercício, deve usar um polar para medição da frequência cardíaca e, desta forma, evitar complicações cardiovasculares que podem ocorrer nestes pacientes. A escala de Borg e o Talk Test podem, também, auxiliar na monitorização do esforço físico e da dispneia do paciente. 

Nesta patologia, ao contrário do que acontece na fibromialgia, a avaliação de forma a ver se a prescrição de exercício é adequada é realizada no momento da sua realização e não passado 24 a 48 horas.
            Devido às possíveis complicações cardiovasculares destes pacientes, o programa de exercício deve ser iniciado com uma intensidade baixa (60%da FCT) que deve ser mantida pelo menos durante 5 dias e depois progredir gradualmente até ao máximo de 80% FCT.
Um programa de exercícios que inclui exercício aeróbio, exercício de alongamento e exercícios pulmonares, mantido por um período de 3 meses, tem eficácia na melhoria da mobilidade da coluna vertebral, na resistência ao esforço e no volume da capacidade vital.
Os programas de exercícios para serem eficazes devem ter várias modalidades de exercícios. Nestes pacientes, uma das modalidade com efeitos benéficos é a hidroterapia, pois diminui a dor e a pressão nas articulações. Esta parece apresentar, a curto prazo (3 semanas) um efeito benéfico suplementar a um programa de exercício tradicional na dor, na avaliação global de saúde, no cansaço, no sono e na funcionalidade. Contudo, a longo prazo (24 semanas) o efeito benéfico da hidroterapia é reduzido, sendo apenas significativo na mobilidade lombar e na avaliação global de saúde.
Outra das funções do fisioterapeuta é a educação ao paciente. Neste caso, o terapeuta pode prescrever exercícios para serem realizados no domicílio e ensinar técnicas/estratégias para melhorar a sua vida diária. Outro ponto a não esquecer é a ergonomia que apresenta um papel importante na adoção de posturas adequadas de forma a prevenir sequelas.
Numa fase severa da doença, quando existe anquilose total da coluna, a mobilização passiva e as posturas são ineficazes e até mesmo perigosas. Nesta fase, o fortalecimento isométrico dos músculos das costas, do diafragma e dos abdominais é útil e seguro. Contudo, é preciso ter especial atenção aos alongamentos máximos, pois podem induzir fraturas sindesmóticas.

domingo, 3 de fevereiro de 2013

Espondilite Anquilosante



A Espondilite Anquilosante é uma doença inflamatória osteoarticular crónica por disfunção auto-imune, resultando na ossificação dos ligamentos, articulações e discos intervertebrais. É caracterizada como uma doença de potencial multissistémico, isto é, pode manifestar-se em diversos órgãos e diversas partes do corpo.
A EA é caracterizada por uma reação inflamatória difusa e por dor em várias articulações, especialmente ao nível da coluna vertebral, que limita, progressivamente, a mobilidade vertebral e torácica durante todo o curso da doença.
 Esta doença faz parte das espondilartrites sero-negativas , que é um grupo interrelacionado de doenças que apresentam certas características: alterações patológicas que afetam basicamente as fixações ligamentares aos ossos (entesite), acometimento das articulações sacroilíacas juntamente com artropatia inflamatória periférica, ausência de fator reumatóide e associação com o HLA-B27.
Nesta doença, as pessoas são afetadas durante os seus anos mais produtivos e de maior responsabilidade familiar. Em geral, inicia-se entre os 15 e os 30 anos de idade, mas, em cerca de 10% dos casos, os primeiros sintomas surgem no final da infância ou na adolescência. Em contrapartida, o início após os 40 anos é relativamente raro.
Durante muito tempo aceitou-se que a EA afetava o sexo masculino em cerca de 80 % dos casos, mas tem-se verificado que isso não corresponde à realidade. O aumento na percentagem das mulheres atingidas tem subido de estudo para estudo, à medida que são utilizados melhores critérios de identificação da doença, uma relação de 3 homens para 2 mulheres poderá estar próxima da realidade
A EA é mais frequente na raça caucasiana, já que a presença do HLA-B27 é significativamente maior.

A causa exata da EA é desconhecida, mas fatores genéticos e ambientais desempenham um papel importante na sua patogénese.
Tem sido confirmada uma forte ligação entre a EA o gene HLA-B27, no entanto, não há ainda um consenso geral sobre a forma como o HLA-B27 contribui para a suscetibilidade da EA.
O papel dos fatores ambientais permanece indefinido, bem como a compreensão da EA envolver a lesão de ligamentos e de tendões (entesites) ou o envolvimento das articulações sacroilíacas.
As alterações patológicas são iniciadas por uma agressão autoimune desconhecida, que provoca o processo inflamatório. Este inicia-se na sacroilíaca, progredindo para a coluna e articulações periféricas, e tem ação lesiva ao nível da fibrocartilagem esquelética, da cartilagem hialina, dos ligamentos e do osso periarticular, levando à anquilose condroóssea e fibrótica.
No processo inflamatório ocorre infiltração de macrófagos que levam à sinovite e às entesites. Posteriormente, os macrófagos são substituídos por linfócitos, promovendo a libertação de um grande número de mediadores inflamatórios, principalmente TNF, fator de crescimento vascular endotelial e IL-1. Estes mediadores inflamatórios provocam a formação de pannus (tecido inflamatório proveniente da sinovial de uma articulação, que forma uma faixa aplicada sobre a cartilagem articular) e de tecido de granulação, havendo uma reabsorção óssea, bem como uma diminuição dos proteoglicanos. Após estes acontecimentos, como há deformação repetida nas estruturas referidas (por exemplo a erosão óssea), a atividade osteoclástica do osso predomina a osteoblástica, provocando mais desgaste ao nível do osso, bem como a libertação do cálcio. Esta libertação do cálcio por parte do osso provoca a respetiva calcificação, que apresenta uma evolução ascendente, ou seja, tem início ao nível da sacroilíaca e progride para a coluna e articulações periféricas através da corrente sanguínea.
Posteriormente, nas lesões mais avançadas, ocorre uma ossificação endocondral que leva à anquilose.
Na coluna, este processo apresenta-se com um formato de coluna em bambu, devido ao processo de ossificação nas fibras exteriores do disco intervertebral que formam os sindesmófitos, sendo estes conhecidos como uma formação de pontes ósseas entre vértebras adjacentes. Ocorre também a formação de osteófitos formados por ossificação endocondral.
 Quanto à dor sentida pelos pacientes com EA, é de carácter nociceptivo ou inflamatório.
A dor nociceptiva inicia-se num recetor periférico e, conforme a localização desse recetor, pode ser classificada em dois tipos gerais.
·         Dor somática: quando o recetor está localizado em tecidos originados da somatopleura (estrutura embrionária que vai dar origem á pele, músculos, tendões, ossos e articulações);
·         Dor visceral: em que o recetor está localizado nos tecidos oriundos da visceropleura - vísceras em geral, vasos sanguíneos, serosas, meninges, entre outros.
A hipersensibilidade é a principal característica da dor nociceptiva e resulta de alterações drásticas na função do sistema nervoso. Este conjunto de alterações, denominadas plasticidade do sistema nervoso, é um fenómeno que acontece perifericamente por redução do limiar de ativação dos nociceptores, bem como centralmente, pela resposta aumentada da medula espinhal aos estímulos sensoriais.
Estímulos mecânicos, térmicos e químicos ativam nociceptores associados às fibras Aδ e C para avisar sobre um estímulo nocivo. Cada estímulo está associado com um certo grau de inflamação que inicia uma cascata de sensibilização periférica com eventos celulares e subcelulares. Células lesadas e fibras aferentes primárias liberam uma série de mediadores químicos, incluindo substância P, neurocinina A e peptídeo relacionado com o gene da calcitonina, que têm efeitos diretos sobre a excitabilidade de fibras sensoriais e simpáticas. Estes mediadores também promovem vasodilatação com extravasamento de proteínas plasmáticas e o recrutamento de células inflamatórias, levando a todo o processo referido na fisiopatologia.